Dizeres Quaisquer Podcast Por Wil Gonçalves arte de portada

Dizeres Quaisquer

Dizeres Quaisquer

De: Wil Gonçalves
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Acerca de esta escucha

Olá, me chamo Wil e esse é um pedacin dimin :) Vamos conversar sobre qualquer coisa. Vezes haverão monólogos, diálogos ou até mesmo conversas em grupo. Não é uma discussão, um debate e menos ainda uma verdade absoluta. É um espasso para erros, criatividade, expressão, para tudo e para todes. Conversemos... Onde me encontrar: @wgondsWil Gonçalves Ciencias Sociales
Episodios
  • pre frente de costas
    May 22 2025

    Tem dias que o peso que carrego nem tem nome. Não é uma dor grande, é só um acúmulo de pequenas coisas: cansaços que ninguém vê, silêncios engolidos, frustrações que não pareceriam grandes o bastante pra justificar o nó no peito. Mas elas pesam. E o tempo, que dizem curar, às vezes só dá mais corpo a essas dores.

    A gente segue, meio no automático, tentando alcançar um futuro que não se vê, guiado por lembranças que não somem. Caminha olhando pra trás, tentando adivinhar o que vem, com os olhos ainda grudados no que foi. Porque tudo o que sentimos passa pelo que já vivemos. A gente nomeia o novo com palavras velhas, reconhece o presente com o cheiro da memória.

    E aí, fica a pergunta: como criar algo novo com um corpo cansado? Como se libertar dos padrões que nos moldaram sem repetir tudo de novo?

    Talvez viver seja isso: um ato de equilíbrio entre o que fomos e o que tentamos ser. Um passo por vez, com fé naquilo que ainda não vimos, mas que, de alguma forma, seguimos acreditando que pode chegar.

    @wgonds

    Más Menos
    6 m
  • Um corpo estranho
    May 8 2025

    Já se sentiu estranhe? Não deslocado de um lugar, mas deslocado do próprio corpo, como se ele fosse uma coisa em constante movimento, sempre um pouco à frente do que você consegue nomear. Um corpo que não cabe, que não responde, que não entende nem é entendido. Um corpo que escorrega entre os dedos, como se estivesse sempre viajando – entre normas, desejos, possibilidades.

    Foi com essa inquietação que me encontrei no texto da Guacira Lopes Louro. "Um corpo estranho". Só o título já parece um espelho. Há algo de profundamente político nesse corpo que se recusa a obedecer. Que atravessa fronteiras impostas e tropeça no caminho dado. Que carrega a estranheza não como um erro, mas como evidência de que há algo mais por vir.

    Esse corpo, que desde cedo escutou comandos – “sente direito”, “fala mais baixo”, “se comporta” – é o mesmo que, com o tempo, aprendeu a se perguntar: mas de quem é esse roteiro? Porque parece que todos nós nascemos com um mapa traçado antes mesmo de sermos nomeades: “é menino”, “é menina”, e então o mundo vai preenchendo os espaços com obrigações, expectativas, renúncias. Você tem que se vestir assim, se portar assim, amar assim. E tudo aquilo que foge disso vira ameaça.

    Mas ameaça de quê? Da estabilidade? Da família tradicional? Da “boa moral”? Vai ver o que esse corpo estranho ameaça, na real, é uma mentira muito bem contada – aquela que diz que há um jeito certo de ser. Que tudo está dado, definido, decidido. Mas e quando o corpo não se encaixa? Quando não obedece? Quando desvia?

    Eu cresci com essa sensação de desencaixe. Sentia que todo mundo tinha entendido uma regra secreta da qual eu nunca soube. E então, em vez de me conformar, comecei a testar. Brinquei com formas, roupas, modos de falar, de amar, de desejar. E percebi que o problema não era o que eu fazia – era o que me diziam que eu deveria ser.

    Guacira diz que a viagem transforma o corpo. Que somos modificades pelo caminho. E talvez seja isso: não há chegada. Há travessia. E nessa travessia, o corpo vai se inventando, se refazendo, rasurando o roteiro. A drag, que se monta exagerando o feminino, mostra justamente isso: o gênero é construção. E se tudo é construção, então tudo pode ser reinventado.

    Ser esse corpo estranho é viver à margem da norma – e ao mesmo tempo, é o que mais expõe a instabilidade da própria norma. É dizer que não existe essência, só performance. E que a liberdade está em poder desmontar, desmontar-se, montar-se de novo.

    No fundo, tudo isso não é sobre “ser diferente”. É sobre existir. É sobre não precisar mais se esconder. É sobre parar de pedir desculpa por ocupar espaço. É sobre transformar a dor da inadequação em um lugar de potência. Porque, se ser quem somos incomoda o mundo, talvez seja o mundo que precise se reorganizar.

    E como diz Preciado, talvez não nos falte coragem. Talvez o que nos falte é o cansaço de fingir. Porque a verdadeira revolução começa quando deixamos de tentar caber – e começamos a criar, enfim, um espaço em que possamos simplesmente ser.

    @wgonds

    Música utilizada: Jack Will - Mantra Minazz

    Más Menos
    17 m
  • é UMA luta.
    Apr 21 2025

    há dias em que viver

    é um verbo empurrado pr’amanhã.


    a gente acorda no ontem,

    carregando restos que viraram peso,

    pendurando no corpo memórias mal digeridas,

    ressacas de um tempo que não soube parar.


    corre no hoje,

    com o coração batendo metas,

    com a cabeça tropeçando nas horas,

    com a alma tentando lembrar que ainda é manhã

    mas já se cobrando como se fosse tarde.


    e só entrega no depois –

    no depois que nunca chega inteiro,

    porque quando chega

    já virou mais uma tarefa vencida,

    mais um alívio breve,

    mais um acúmulo na agenda da exaustão.


    o corpo levanta,

    mas a alma ainda dorme –

    ou melhor,

    a alma continua trabalhando

    enquanto o corpo finge que descansa.


    tudo exige,

    cobra,

    grita,

    empilha tarefas como quem empilha pedras

    nas cachoeiras ‘marasmas’.


    não há pausa,

    não há freio,

    não há colo.

    só uma esteira que gira

    e gira

    e gira,

    até que vem a vertigem

    e a gente esquece

    de onde veio

    e sequer sabe

    pra onde vai.


    a vida virou isso:

    uma dialética sem síntese.

    uma luta sem trégua.

    uma demanda que gera outra,

    e mais outra,

    e mais outra…

    até o infinito de um dia comum.


    preciso acordar amanhã cedo.

    [são 2h37 da madrugada]

    e o sono se recusa a vir deitar comigo.


    e mesmo o descanso

    [quando vem]

    chega culpado,

    envergonhado,

    pedindo licença

    num lugar onde o silêncio é luxo

    e o cansaço é fraqueza.


    mas ainda assim,

    às vezes,

    há brechas.


    um café que se toma mais lento,

    uma rega nas plantinhas com amor,

    um vento no rosto,

    um canto de passarinho

    que rompe o pedido de pressa.


    nessas fissuras do tempo,

    a gente lembra:

    sentir cansaço também é estar vivo.

    não dar conta também é verbo.

    parar também é verbo.

    existir não é produção.


    e talvez a revolução

    seja, primeiro,

    descansar.


    então,

    amanhã,

    lutarei apenas UMA luta,

    E SE QUISER.


    Más Menos
    2 m
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